Precipício Mental - Insensatez

segunda-feira, 5 de julho de 2010

O quanto eu te assusto?

Um olhar.
Você... Sempre misteriosa e ilegível, uma incógnita. Sempre se escondendo atrás de historinhas, anedotas e piadas. Fingindo ser o que não é, o que nunca foi e nem quer ser. Sempre fala tudo, sem dizer nada.
Não preciso de palavras, seus olhos lampejam todo seu sentimento, todo seu interior. Em poucos segundos, penetro no seu olhar - que me consome. Apesar de indecifráveis, consigo ver todas as perguntas... e as minhas respostas.
Eu sorrio, você cora.
Vejo tudo, sem saber nada; sem poder saber.
O mistério, em ti, assume um papel diferente em seus olhos quando de encontro aos meus. Eu vejo e você sabe, e me permite ver, mas não entendo nada.  
Você sorri, eu finjo dar de ombros.
Você parece assustada, mas fixa o olhar no meu, fazendo segundos virarem horas, horas virarem reflexões e reflexões virarem medo. Medo meu, medo seu. Meu medo de saber, nosso medo de ser, seu medo de querer.
Então, me diga...O quanto isso te assusta?

Eu deveria te esquecer.

Estavam os dois debaixo da luz do único poste que iluminava a rua. De longe, parecia tudo bem; mas na verdade, eles brigavam como duas crianças, de forma quase silenciosa. De cenho franzido, ele murmurava um discurso, enquanto ela fazia careta.
- A culpa disso foi toda sua! - disse ele ao final, sem medir o tom.
Ela, desacostumada com aquilo, enfureceu-se de um forma atípica.
- A culpa é minha? Você me fez acreditar em suas palavras, quis me iludir e me magoar. Mas sabe qual é a verdade? Eu nunca acreditei em você. Toda a tristeza foi por conta de sua intenção inescrupulosa e não por eu ter realmente acreditado nisso tudo. - seus olhos enchiam-se de lágrimas, enquanto jorrava palavras, que se formavam em sua voz grave e rouca.
Ele pegou-a pelos braços, apertando-os como torniquetes, perdendo totalmente o juízo. Ela fuzilou-o com os olhos, contendo um grito de dor.
- O que você disse? - disse ele, entredentes. Os olhos ardendo em fúria.
- Me solta agora, você está me machucando! - ela ofegou.
Tudo começou a girar em sua cabeça, ela sentia suas mãos formigarem enquanto o fitava com expressão de desespero. Um filme passou em sua mente: Tudo o que ele disse, todos os momentos de carinho, todo o amor que ela sentia, tudo! Tudo estraçalhaço, esmagado, destruido...
Foi quando, de repente, ele a soltou... O súbito jorro de sangue em suas veias foi quase doloroso. Ela suspirou e se afastou cambaleando, sem forças para reagir.
Ele caiu em prantos, desesperadamente. Tentava pronunciar palavras, mas elas saiam ininteligíveis. Seu choro interrompia toda e qualquer frase que tentava dizer. Ela, sem saber o que fazer, começou a chorar junto dele. Os dois choravam, como dois bebês.
Ninguém soube, ninguém ouviu. Eram três da manhã, não havia ninguém na rua. Em especial, naquela rua, que era, independente da hora, extremamente deserta. Não havia uma alma, uma casa... Só casebres abandonados e lojas fechadas por conta da hora.
Foi, então, em meio às lágrimas, sentados no meio-fio, que ele conseguiu pronunciar uma frase, entre soluços. Não exatamente o que queria, nem do jeito que queria, mas foi tudo o que precisava ser dito.
- Você é tudo que eu quero e sempre quis, e nada mais importa.

Ela sorriu.